Por Joice Santos
Jornalista em colaboração para a SBF
A SBF (Sociedade Brasileira de Física) entrevista o professor Dr. Farinaldo Queiroz da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e do International Institute of Physics (UFRN – IIP), que fez um panorama do II Encontro de Primavera. Sendo um dos coordenadores e organizadores, o professor fala do evento que aconteceu no nordeste, destaca a participação dos alunos e da experiência de unir num mesmo encontro pesquisadores das áreas de Partículas e Campos e de Física Nuclear.
A descentralização de eventos é um dos objetivos da SBF, que procura unir forças para que haja edições de seus encontros científicos em todas as regiões do país. Dessa forma, aconteceu o II Encontro de Primavera em Natal-RN na UFRN, nos dias 26 a 29 de setembro de 2022. Coordenado pelos professores Farinaldo Queiroz e pelo professor Manuel Malheiro do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), o evento reuniu 243 pessoas, sendo 22,3% do sexo feminino, 30% do nordeste e 57,5% de estudantes. A SBF convidou o professor Queiroz para avaliar essa edição itinerante, a importância da participação dos alunos e demais particularidades do evento. Em formato de conversa pergunta e resposta, o professor diz sua opinião.
Farinaldo Queiroz é professor na UFRN-DFTE desde 2018 e líder do Grupo de Física de Partículas e Astropartículas no IIP. Pesquisador Associado dos institutos ICTP-SAIFR, e SAPHIR (Chile) e cofundador do instituto de pesquisa SAPHIR. Ganhou prêmio de melhor tese de doutoramento em Física no ano 2013 pela SBF. Escritor de um livro para o ensino básico “COSMOS” com versão para surdocegos. Coordenador da área de Física de Partículas da SBF (2022-2023), e atua como membro de CA do CNPq/COCEX. É bolsista de produtividade 1D do CNPq.
SBF: Professor, tendo em vista que esta foi uma edição do evento que aconteceu no nordeste, gostaria que você avaliasse como foi esse Encontro na região e o quanto é importante ter essa itinerância de eventos em outras localidades fora do eixo do sul/sudeste.
Professor Farinaldo Queiroz: Acredito que o evento foi um sucesso. A SBF fez um esforço para manter a taxa de inscrição a um preço mais acessível para estudantes, e esse esforço foi visível na quantidade de estudantes que tivemos no evento, diante de uma bolsa de IC e pós-graduação que não sofre reajuste há muito tempo. Mais de 55% dos participantes eram estudantes. Algo fora do comum para esse evento. É de conhecimento de todos que as universidades do sul-sudeste em geral, salvo exceções, possuem mais recursos na pós-graduação e contam com aporte significativo das agências de fomento locais. Portanto, é relativamente mais fácil a ida de pesquisadores do sul-sudeste para o norte-nordeste (e centro-oeste) que o contrário. Principalmente no que diz respeito aos estudantes, pois estudantes do nordeste dependem fortemente dos recursos de suas respectivas pós-graduações. Na minha opinião, mesmo que esse não fosse o caso, de toda forma um evento nacional por si só deveria ser itinerante, pois só assim deixaremos um legado científico nacional, e iremos popularizar as diferentes áreas de pesquisa que esse encontro engloba, nas diferentes regiões desse país, de dimensões continentais. Quando nos tornamos docentes e trabalhamos na formação de recursos humanos, nossa atividade ganha outra dimensão e outro propósito. Atuamos não simplesmente em busca de conquistas pessoais, mas em prol de uma pesquisa e educação mais forte em todo o território nacional. A comunidade como um todo ganha quando temos grupos fortes espalhados no território nacional. O agradecimento e felicidade dos estudantes durante o evento foi emocionante. Por isso peço desculpas a todos pela minha comoção durante a assembleia da SBF.
SBF: Como foi a experiência de se ter a junção dos eventos de Partículas e Campos e de Física Nuclear?
Professor Farinaldo Queiroz: Chamo atenção ao fato de que dependendo do tema de pesquisa que você estiver atuando, é difícil distinguir essas áreas. Muitas pessoas trabalham na interface entre as áreas. Interdisciplinaridade é e sempre será importante. Portanto, é natural que uma instituição como a SBF promova a interdisciplinaridade através da unificação desses encontros no agora chamado Encontro de Primavera. Pudemos ver várias pessoas tidas como “de Nuclear” em paralelas de “física de partículas” e vice-versa. Acredito que o encontro só tem a ganhar com a unificação. Obviamente organizar um evento maior e com mais pessoas na organização traz mais dificuldades, mas como disse na abertura do evento, todo o esforço vale a pena quando você vê aquela multidão com fome de ciência reunida no auditório. A maior dificuldade do evento em si é a orçamentária. A verba que veio da CAPES foi 35% inferior a 2019, que já foi pequena. Graças a um enorme apoio da UFRN, FUNPEC (Fundação Norte-Rio Grandense de Pesquisa e Cultura) e empresas privadas do ramo de computação de alto desempenho como a VERSATUS HP/DELL e LANIAQ que conseguimos realizar o evento, além da ótima infraestrutura do IIP, e os seus profissionais que atuaram voluntariamente em benefício do evento. Fomos contemplados com 35 mil reais do CNPq, mas essa verba, apesar de importante, chegou tardiamente, e foi basicamente direcionada para emissão de diárias para os palestrantes convidados do evento.
Afirmo que sem a participação do comitê de organização de física nuclear, e partículas e campos esse evento não teria sido realizado com sucesso. Agradeço muito a atuação do professor Manuel Malheiro como chair de Física Nuclear pela paciência e ajuda em todo o processo. Seria um longo texto para explicitar a participação de todos na comissão. Poderia citar as inúmeras reuniões, ligações tarde da noite, sugestões de programa, orientações, e decisões tomadas pelos membros da comissão organizadora que foram cruciais para o andamento do evento. Agradeço muito aos secretários da SBF, principalmente Roberto e Fernando com quem tive mais contato no processo. A presença do Roberto e da Beatriz durante os dias de evento foram importantes para lidar com todo o processo burocrático do evento. Ter secretários da SBF durante o evento é importante e traz uma identidade para o evento.
SBF: Quais outros eventos você gostaria de ver acontecendo no nordeste para que os pesquisadores, especialmente os alunos, possam ter acesso?
Professor Farinaldo Queiroz: Acredito que deveríamos realizar anual ou bienalmente uma escola regional. Por ser uma escola, ela deve ser nos moldes do último encontro, contando com uma baixa taxa de inscrição, para os estudantes da região, seguindo os padrões da tradicional Jorge André Swieca. Pelo mesmo motivo que destaquei anteriormente, os estudantes do nordeste tem dificuldade de participar da escola Jorge André Swieca. Desta forma deveríamos organizar uma escola na região.
SBF: Como o encontro contribuiu para a divulgação do IIP na comunidade científica brasileira?
Professor Farinaldo Queiroz: O “International Institute of Physics” realiza eventos regulares, mas os eventos são preferencialmente de pequeno porte, focados em tópicos específicos e com caráter internacional. Além disso, uma aplicação deve ser submetida em novembro para o comitê internacional que, caso aprovada, permita a realização do evento não no ano seguinte, mas no subsequente. Todas essas exigências inviabilizam a realização de eventos tradicionais, sejam nacionais, regionais ou internacionais. Em função de questões orçamentárias, o calendário de atividades do IIP ficou mais livre. Felizmente, o comitê internacional permitiu a realização do Encontro de Primavera 2022. Acredito que a maioria dos pesquisadores presentes não conhecia o instituto e isso foi importante para mostrar para a comunidade de Física de Partículas, Campos, Física Nuclear e Cosmologia que estavam presentes, que existe um centro de excelência e com boa infraestrutura nessa região do país. A palestra do nosso diretor, Alvaro Ferraz, que abriu o evento, demonstrou isso bem.
SBF: Poderia fazer uma avaliação do que foi o II Encontro de Primavera? Gostaria de acrescentar algo?
Professor Farinaldo Queiroz: Acredito que vale destacar o esforço que muitas pessoas do sul-sudeste fizeram para vir ao evento. Pois há um bom tempo os recursos para educação e pesquisa vêm sofrendo com seguidos cortes, enfraquecendo suas pós-graduações, grupos de pesquisa e contribuindo para uma grande evasão de bons estudantes. Tivemos percalços, como demora em conseguir financiamento da FAPESP, que chegou na véspera do evento. Mesmo diante disso tudo, muitos vieram ao evento, alunos e doutores. Abro aspas para a declaração de um estudante meu de IC, Yago Brasil, “Nossa professor, esse encontro me vez perceber que eu faço parte de uma comunidade científica, e que eu contribuo para ela. Muito legal isso”. Esse sentimento é compartilhado por todos. Enfim, obrigado a todos que participaram do II Encontro de Primavera.