No dia 15 de março realizou-se uma reunião por iniciativa do presidente da SBPC, Prof. Ildeu de Castro Moreira, com o MEC visando iniciar discussões que permitissem às sociedades científicas colaborar com a elaboração e a análise da BNCC (Base Nacional Comum Curricular), além de se manifestar de aneira geral com relação ao tema. Participaram da reunião representantes das associações científicas convidadas (ABC, ABRAPEC, AGB, FESBE, SAB, SBEM, SBEnBio, SBF, SBG, SBM e SBQ) juntamente com representantes do MEC sob a coordenação da secretária executiva, Profa.  Maria Helena Guimarães de Castro, e alguns assessores e consultores associados ao projeto de elaboração da BNCC.

A Profa. Maria Helena fez um breve relato sobre o processo de elaboração das bases, desde sua primeira versão em 2013, passando pela exposição de alguns pressupostos que nortearam a produção da terceira versão ora em curso e finalmente informando que a nova versão do documento ainda não está finalizada. 

Fundamentalmente, a maior preocupação dos gestores federais é com o fato de que aproximadamente um quarto dos estudantes que concluem o Ensino Fundamental não ingressam no EM (Ensino Médio), e em torno de um terço dos que ingressam no EM são reprovados na transição do primeiro para o segundo ano. Um dos papéis da reforma do Ensino Médio e da BNCC seria de efetivar uma maior atratividade do EM para os estudantes, bem como indicar possíveis ações inclusivas e de diversidade.

Na sua fala final, a secretaria executiva do MEC deixou claro que as associações científicas terão acesso à BNCC, quando de seu envio ao Conselho Nacional de Educação. Ela acrescentou que o material do Ensino Médio ainda não fora divulgado pois nova versão ainda não está finalizada. Segundo explicitado, um dos motivos da demora na apresentação da nova versão se deveu a ajustes necessários para se adaptar à reforma do Ensino Médio (EM), aprovada pela Lei 13.415, em fevereiro de 2017. Foi também apontado que é possível sugerir mudanças (a partir das associações científicas) durante a discussão do CNE.

As discussões durante a reunião se polarizaram sobre qual seria o papel da BNCC no combate às más condições da educação pública, e sobre a estrutura curricular associada à BNCC.

Nos próximos parágrafos apresentamos alguns tópicos que foram levantados pelas associações científicas durante a reunião, para as reflexões da comunidade da SBF.

  • O Brasil já apresenta uma tradição disciplinar, e aparentemente a BNCC do Ensino Médio propõe uma estrutura curricular que rompe com as disciplinas e mesmos com as unidades temáticas e objetos de conteúdos presentes na proposta do Ensino Fundamental – que estavam começando a ser compreendidas pelos professores – e propõe uma organização baseada apenas em competências e habilidades. A ausência de uma maior definição curricular poderá dificultar a compreensão das propostas por parte dos gestores, formadores e professores. Como essa estrutura irá dialogar com as tradições curriculares brasileiras é outro ponto a ser destacado na discussão dessa proposta.
  • Um temor de várias das sociedades científicas presentes seria uma simplificação dos itinerários formativos, diminuindo a participação das Ciências da Natureza (CN) nesses percursos. Ainda nessa linha, existe uma aparente tendência a transformar as atividades de experimentação em atividades computacionais de simulação, afastando os estudantes de um contexto real de experimentação, o que não é condizente com uma formação completa das habilidades dos alunos.
  • Olhando apenas para as 1.800 horas comuns a todo o Brasil, temos uma – provável – diminuição da carga horária em ciências. Como isso seria compatível com o letramento científico? O que priorizar em uma versão integrada e com menor carga horária de ciências/física? A proposta dessa discussão aqui apontada não é – em hipótese alguma – validar a proposta para a BNCC, mas sim buscar um posicionamento claro de nossa sociedade.
  • A proposta é a de que os conteúdos tradicionais de ciências do EM passem a ser apresentados de forma integrada em CN (Ciências da Natureza), excluindo a explicitação das disciplinas específicas (física, química, biologia). Visto que os professores são formados de maneira disciplinar no país, como realizar a formação continuada ou a formação inicial desses novos professores? Quem irá assumir essa formação e sob quais critérios?
  • Uma das possíveis ações das sociedades seria iniciar conversas com as diferentes sociedades científicas para discutir de forma conjunta se é a melhor opção a integração dos tópicos associados a CN, e em caso afirmativo, como esse compartilhamento interdisciplinar deveria ocorrer.
  • Na proposta temos que 1.200 horas do EM serão destinadas a distintos Itinerários formativos, ou seja, as disciplinas e os objetivos dessa etapa serão definidos posteriormente pelos Conselhos Estaduais de Educação e/ou pelas Secretarias Municipais de Educação. Essa formação complementar pode ser uma formação técnica associada a questões regionais; um aprofundamento nos conhecimentos de matemática, ciências da natureza ou ciências humanas. É fundamental que se inicie uma articulação com os conselheiros nos diferentes estados, buscando que se garanta a melhor inserção de ciência possível nesses itinerários.
  • No caso de CN/física, tememos que a falta crônica de professores com formação na área – principalmente de física e de química – resulte efetivamente na exclusão de conhecimentos mínimos de física, em uma situação pior que a atualmente existente, diminuindo o espaço para as ciências nos itinerários formativos. O número de professores que lecionam física com licenciatura em física ou com bacharelado em física (com complementação pedagógica) correspondem a cerca de 28% do total. Para a área de química o percentual é de cerca de 46%[1]. Nota-se que – em função da interpretação dos Conselhos Estaduais de Educação – pode ocorrer a diminuição do espaço de atuação de nossos licenciados/bacharéis, sob o argumento da falta de professores, sem considerar os reais motivos que provavelmente conduzem a essa falta, que está associada às condições de trabalho oferecidas.
  • Na proposição dos itinerários formativos, existe uma preocupação presente entre as sociedades científicas que é o ensino de CN ser substituído por uma estrutura associada a tecnologias ou a outras áreas de conhecimento que não a CN, principalmente nos itinerários formativos.

A SBF está organizando – atendendo a uma sugestão do Conselho – a formação de um grupo de trabalho para discutir, analisar e propor sugestões sobre a BNCC, no que se refere à participação das ciências, e principalmente a física, na estrutura proposta.

Maurício Kleinke – Secretário para Assuntos de Ensino da SBF
Maurício Pietrocola – Conselheiro da SBF