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Ignacio Bediaga, presidente do INCT CER-Brasil, realiza apresentação durante a Mesa Redonda “A Associação do Brasil ao CERN: Status e Perspectivas”, durante o Simpósio “Dos Raios Cósmicos aos Aceleradores de Partículas”, realizado na semana passada no Instituto de Física da Universidade de São Paulo. (Crédito: IFUSP)
Ignacio Bediaga, presidente do INCT CER-Brasil, realiza apresentação durante a Mesa Redonda “A Associação do Brasil ao CERN: Status e Perspectivas”, durante o Simpósio “Dos Raios Cósmicos aos Aceleradores de Partículas”, realizado na semana passada no Instituto de Física da Universidade de São Paulo. (Crédito: IFUSP)

Pesquisador do CBPF, coordenador do INCT CERN Brasil, diz que em 2017 a Rede Nacional de Física de Altas Energias (RENAFAE) passou por transformações importantes no sentido de coordenar as atividades da área, mas, para ele, são os órgãos de fomento que precisam se organizar para financiar colaborações internacionais de longo prazo.

O pesquisador titular do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), Ignácio Alfonso de Bediaga e Hickman, argumenta que os cientistas brasileiros que integram projetos de Física de Altas Energias estão muito organizados frente aos desafios de pesquisa que experimentos como o CERN vem exigindo da comunidade nos últimos 30 anos, mesmo sem a participação direta do governo brasileiro.

Ele considera que o acordo feito pelo governo brasileiro é muito importante. No entanto, ele sugere que a comunidade científica não teve uma participação ativa nesse processo. Além disso, destaca a necessidade de ações coordenadas por parte das agências de financiamento governamentais para promover não apenas a colaboração do Brasil no CERN, mas também em todas as grandes colaborações internacionais.

Suas opiniões, discutidas durante o Simpósio “Dos Raios Cósmicos aos Aceleradores de Partículas” no Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IFUSP) na semana passada, foram reiteradas em uma entrevista ao Boletim SBF. Durante o evento, Ricardo Galvão, presidente do CNPq, destacou a importância da organização da comunidade científica diante dos desafios de financiamento, e também sugeriu que o financiamento para o envio de técnicos para colaborações internacionais deveria ser assumido pelas instituições de ensino como parte de sua contrapartida.

Amanhã, dia 12 de julho, durante a 76ª reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), será realizado o painel virtual “A associação do Brasil ao CERN – oportunidades, desafios e benefícios para a sociedade”, que será apresentado pelo físico Sandro Fonseca (UERJ/CPTC/SBF) com transmissão pelo YouTube das 13h às 15h30, com a participação de Bediaga, Galvão e Leandro Salazar de Paula (UFRJ).

Bediaga explica que Galvão contribuiu diretamente para a criação da Rede Nacional de Física de Altas Energias (RENAFAE) em 2008, e que muita coisa mudou desde então. O cientista do CBPF cita como marco o ano de 2017. Nesta época, foram organizados grupos transversais a partir da técnica utilizada em detectores, agrupando cientistas de diferentes experimentos nessa filosofia. “As pessoas amadureceram. E viram essa perspectiva de trabalhar junto, independente de qual colaboração se participa.”

A organização da rede é tão grande, cita Bediaga, que no fim de 2022 foi aprovada a criação do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) CERN-Brasil, cujo primeiro workshop foi realizado em setembro do ano passado, com a participação de vários cientistas, incluindo o professor Galvão. “Dois terços do INCT são destinadas às ações transversais; um terço, para viagem, para bolsas. Essa é a filosofia que foi implantada”, explica Bediaga, cuja luta foi determinante para a criação do INCT CERN-Brasil, mas que ainda defende a criação de INCTs para as áreas de astropartículas e para o experimento DUNE, participação brasileira no gigantesco observatório de neutrinos que está sendo construído nos Estados Unidos.

Na visão de Bediaga, a principal desorganização vem dos órgãos de financiamento, que não desenvolvem projetos em comum, algo que seria extremamente importante para projetos de colaborações internacionais, que demandam recursos contínuos por prazos longos, de até 20 a 30 anos. Ao longo dos últimos 30 anos, cientistas brasileiros vêm participando de projetos importantes no CERN. Hoje, são 135 cientistas brasileiras em quatro experimentos dentro do LHC e um experimento fora do acelerador, mas dentro do CERN, com um apoio do governo ao Renafae para manutenção e bolsas de pesquisas por instituições de fomento estadual. Mas, com a adesão do País ao CERN, Bediaga avalia que é preciso mais organização não apenas da comunidade científica. Ele, inclusive, defendia em reuniões no governo, desde março do ano passado, a criação de fundo específico para desenvolver a ciência brasileira nesse experimento para além do valor que o Brasil terá que aportar no CERN diretamente, como faz Portugal.

“No acordo, o corpo científico apareceu lá para o álbum de fotografia, mas a negociação entre o CERN e o Ministério (Ciência, Tecnologia e Inovações) foi feita sem a participação nossa direta, o que seria muito conveniente. É um projeto científico, não é um projeto industrial, embora a indústria seja importante participar, mas é um projeto científico”, afirma. “Na prática, a nossa vida não mudou nada, porque esse dinheiro que o Brasil está pagando ao CERN é destinado para as empresas ou pagamentos de pessoal brasileiro que vai trabalhar lá, etc. Mas não para os grupos cientistas.”

Outro ponto que Bediaga questiona é a afirmação de Galvão de que o envio de técnicos ao LHC deveria ser uma contrapartida das instituições de ensino ao financiamento obtido, que muitas vezes já inclui gastos com viagens de cientistas. “O problema todo é que as instituições brasileiras, tirando as paulistas, não têm muito dinheiro para pagar isso. Essa é uma realidade bastante generalizada no Brasil. Eu não consigo ver a UFRJ pagando um técnico para ir para o CERN. Não consigo ver isso. Mal tem dinheiro para manter a instituição”, afirma. “Na situação assintótica, falando um pouco de matemática, se não tiver dinheiro para os brasileiros participarem, daqui a pouco o Brasil está no CERN, mas os cientistas brasileiros acabarão saindo.”

Ele reafirma não ser contra o País aderir ao CERN, mas avalia que “existe um problema estrutural no Brasil”. “Eu já venho falando isso, da parte dos órgãos financiadores, é preciso um caminho para financiamento de grupos brasileiros em grandes colaborações, isso não é só Altas Energias. Você tem que ter uma perspectiva de financiamento considerando três características: construção, manutenção e projetos de longo prazo.”

(Colaborou Roger Marzochi)