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O estudo explorou como os coloides se comportam quando prensados entre duas superfícies rígidas
O estudo explorou como os coloides se comportam quando prensados entre duas superfícies rígidas.

José Rafael Bordin publica artigo com destaque na prestigiada revista Soft Matter sobre pesquisa que pode aprimorar a produção de redes cristalinas para ampliar qualidade e a resistência de materiais bidimensionais.

Telas de celular e de televisores muito mais resistentes, de melhor resolução e mais eficientes energeticamente. Essa é uma das várias possíveis aplicações da pesquisa teórica liderada pelo professor José Rafael Bordin, da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), sobre os chamados “coloides de caroço amolecido”, que são macromoléculas com um núcleo duro e uma casca mole. Ele é um dos pesquisadores que assina o artigo “Core-softened colloid under extreme geometrical confinement” publicado no dia 28 de junho de 2024 no periódico Soft Matter da Royal Society of Chemistry. O artigo ainda contou com participação do Prof. Leandro Batirolla Krott, da Universidade Federal de Santa Catarina, e do Dr. Thiago Puccinelli, egresso do grupo e atualmente fazendo o pós-doutorado na Universidade de São Paulo.

José Rafael Bordin, da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), destacou-se no estudo de “coloides de caroço amolecido”
José Rafael Bordin, da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), destacou-se no estudo de “coloides de caroço amolecido”.

Em decorrência dos seus estudos sobre a Física da Matéria Mole e Biológica, especialmente em sistemas com confinamento extremo, Bordin foi reconhecido pelo periódico como “Emerging Investigator”, título concedido a cientistas no início de sua carreira independente com potencial para influenciar futuras direções nesta área de estudo. O artigo ainda ganhou destaque na edição do periódico, sendo Inside Front Cover -só não foi capa porque a editora lhe pediu um valor tão alto que era impraticável para a realidade do financiamento da pesquisa científica no Brasil.

“Após passar 10 anos do doutoramento, receber esse reconhecimento internacional no momento em que estou me consolidando pesquisador independente, em uma Universidade longe dos grandes centros, é uma grande alegria e mostra que a pesquisa que desenvolvo está no caminho certo. Especialmente, esse reconhecimento é uma forma de a revista prestigiar e incentivar jovens pesquisadores que possuem já um certo destaque, e que possuem potencial para se tornarem os futuros líderes da área”, diz o cientista em entrevista ao Boletim SBF. Ele também foi reconhecido como “Emerging Investigator” pelo Journal of Chemical Physics/AIP no ano passado.

Estudo abordou nanopartículas esféricas com um núcleo duro, feito de metais ou semimetais, revestidas por polímeros
Estudo abordou nanopartículas esféricas com um núcleo duro, feito de metais ou semimetais, revestidas por polímeros.

Bordin, que atua no Instituto de Física e Matemática (IFM) da UFPEL, tem se destacado por suas pesquisas na área de Física da Matéria Mole. “A Matéria Mole não é apenas mole por não ser dura, mas é fascinante porque é deformável, e isso leva a vários comportamentos únicos, e porque ela nos cerca – nós, como seres vivos, somos feitos basicamente de Matéria Mole!”, explicou Bordin, destacando que os processos envolvidos estão na escala de energia térmica, encontrada no dia a dia. Ele exemplificou com o leite, que é uma solução coloidal na qual proteínas e gorduras formam bolotas em uma solução aquosa. “A transformação do leite em manteiga é um exemplo de organização, ela ocorre quando a agitação mecânica rompe as membranas das gotículas de gordura, permitindo que elas se agreguem e formem uma estrutura mais densa. Neste trabalho também tentamos explorar a agregação de moléculas, mas que não possuem aplicações na culinária.”

Bordin conta que seu interesse nesta pesquisa publicada pela Soft Matter estava nos coloides de caroço amolecido, que possuem um núcleo duro e uma casca externa mais macia. “Na natureza, existem proteínas globulares que têm um formato hemisférico e podem ser levemente amassadas, mas aqui nossa inspiração foram nanopartículas esféricas com um núcleo duro, feito de metais ou semimetais, revestidas por uma camada de polímeros – como se fossem bolas peludas”, diz. “Modelar esse tipo de sistema não é muito trivial pois existem muitos componentes, especialmente se queremos ver algo em grande escala de tamanho – por isso usamos modelos efetivos que tornam as simulações factíveis”, afirmou Bordin.

Ele explicou que, assim, a abordagem usada tenta compreender o comportamento mais geral dos coloides de caroço amolecido, sem focar em um material específico, e como podemos manipular a organização deles. Essas nanopartículas têm aplicações em novas tecnologias, sendo que os cristais coloidais 2D formados por elas são usados em dispositivos fotônicos, sensores, células solares, displays, entrega controlada de medicamentos, materiais estruturais reforçados e em tecnologias de imagem e padrões em nanoescala, aproveitando suas propriedades únicas para melhorar a eficiência e a funcionalidade dessas aplicações. Por exemplo, cristais coloidais 2D melhoram a qualidade da imagem e a eficiência energética de telas de computadores e celulares ao manipular a luz de forma mais precisa, permitindo cores mais vibrantes e um consumo de energia reduzido. O objetivo é criar estruturas ordenadas que difratam a luz de maneira controlada, resultando em melhor brilho e contraste nas telas. “É como se você tivesse um ‘Lego molecular’. No nosso caso, jogamos as peças em uma caixa, chacoalhamos e analisamos em quais condições esses blocos de construção microscópicos podem gerar um padrão macroscópico específico”, comparou Bordin.

O estudo explorou como os coloides se comportam quando prensados entre duas superfícies rígidas. “Mostramos que, sob certas condições, os coloides nesse confinamento extremo, como se fosse um mundo quase 2D, podem gerar estruturas bidimensionais que não são observadas no mundo 2D ou 3D”, disse Bordin. Isso indicou que o confinamento geométrico pode controlar o cristal resultante, permitindo a geração de estruturas que não seriam vistas em um sistema bidimensional simples. “Fazendo a analogia com o Lego, imagina que você compra uma caixinha de Lego para montar a Millennium Falcon e joga as peças dentro de uma caixa bem fininha ou de uma um pouco mais espaçosa. Em uma, você consegue a Millennium Falcon, mas de outra forma, usando as mesmas peças, você pode conseguir a Estrela da Morte.” Esse resultado sugere uma nova rota experimental para controlar o crescimento de cristais bidimensionais. Após os eventos climáticos extremos que ocasionaram a maior tragédia climática no Rio Grande do Sul, a publicação dessa pesquisa na Soft Matter foi uma grata surpresa à equipe de Bordin, que espera continuar estudando o comportamento das coloides e nanomateriais a fim de auxiliar no desenvolvimento de novas tecnologias.

(Colaborou Roger Marzochi)