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A Real Academia Sueca de Ciências concedeu o Prêmio Nobel deste ano a três pesquisadores por suas contribuições à física de buracos negros: Roger Penrose(1/2), Reinhard Genzel(1/4) e Andrea Ghez(1/4).

A história da descoberta dos buracos negros transcende a ficção. Dois meses depois de Einstein ter anunciado sua teoria da Relatividade Geral na Academia Prussiana de Ciências em 1915, segundo a qual a gravitação seria uma consequência do espaço-tempo ser elástico e não rígido, o astrofísico alemão, Karl Schwarzschild, que havia se alistado voluntariamente e servia como oficial no front russo, descobriu uma das soluções mais importantes das Eqs. de Einstein; uma que continha aquilo que mais tarde seria denominado “buraco negro.” Schwarzschild morreria poucos meses depois, ignorando isto completamente. Em resumo, buracos negros são regiões compactas de puro vácuo que curvam o espaço-tempo sob si próprios impedindo que qualquer informação possa escapar de seu interior. A fronteira (de não-retorno) que caracteriza os buracos negros é chamada de horizonte de eventos. 

Talvez a contribuição mais importante do físico e matemático britânico, Roger Penrose, que abocanhou metade do Prêmio Nobel deste ano, tenha sido a introdução de métodos globais de topologia em Relatividade Geral. Foi graças a estas técnicas que ele conseguiu demonstrar em 1965 um resultado citado nominalmente pelo Comitê Nobel para justificar a concessão da honraria. Em poucas palavras, Penrose mostrou de forma bem geral que buracos negros formados pelo colapso de estrelas “normais” (i.e., com densidade de energia positiva) devem possuir em seu interior uma singularidade espaço-temporal. Tais singularidades podem ser consideradas uma verdadeira ruptura do próprio espaço-tempo. Penrose foi ainda mais longe e, além de provar que todo buraco negro tem uma singularidade em seu interior, conjecturou em 1969 que não haveria singularidades “nuas”, i.e., toda singularidade espaço-temporal gerada por colapso estelar estaria sempre no interior de um buraco negro. É o que passou a ser denominado de Conjectura do Censor Cósmico: toda singularidade espaço-temporal estaria “vestida” por um horizonte de eventos, protegendo, assim, sua intimidade dos olhares curiosos de observadores distantes. A Conjectura do Censor Cósmico tem se confirmado, pelo menos no contexto da física clássica, desde então. É impossível fazer jus, em uma pequena nota, a todas as contribuições seminais de Penrose à física, em geral, e à gravitação, em particular.

Quanto a confirmações experimentais da existência de buracos negros, até 1960 havia uma anedota segundo a qual a melhor evidência de que buracos negros existiam era o fato de nunca terem sido observados. Isso só começou a mudar em 1963 quando se percebeu que os, assim chamados, quasares, fontes compactas de radio, eram objetos extragalácticos, emitindo uma quantidade tão grande de energia eletromagnética que, talvez, só pudessem ser explicados por meio de buracos negros. A ideia era que algum buraco negro no centro do quasar convertesse parte da energia carregada pela matéria, prestes a entrar em seu interior, em ondas de rádio que escapariam para longe, podendo ser observadas em galáxias distantes como a nossa. No 1º Texas Simpósio de Astrofísica Relativística que aconteceu em dezembro de 1963, Thomas Gold, da Universidade de Cornell, teria dito que o mistério dos quasares “permite sugerir que os relativistas … não são apenas ornamentos culturais magníficos, mas podem ser úteis à ciência…” Ele estava certo.

De 1963 em diante evidências circunstanciais da existência de buracos negros começaram a surgir em diferentes contextos. É aí que entra o astrofísico alemão Reinhard Genzel e a astrônoma americana Andrea Ghez que abocanharam juntos a outra metade do Prêmio Nobel de Física deste ano. Suas observações iniciadas no final do século passado estão entre as melhores evidências indiretas da existência de buracos negros. Monitorando as órbitas das estrelas no centro da Via Láctea, Ghez e Genzel concluíram independentemente que existe um corpo invisível com uma massa equivalente a 4 milhões de sóis em uma região menor que o sistema solar. A melhor explicação para isto é que se trata de um buraco negro. Hoje sabemos que, tipicamente, toda galáxia deve ter um buraco gigante no centro. Como se formaram, ainda é um mistério.

Aprendemos muito sobre os buracos negros desde sua descoberta há mais de 100 anos.  Os trabalhos de Penrose, Genzel e Ghez ajudaram muito neste sentido, jogando luz, onde, literalmente, só havia escuridão. 

George Matsas
Instituto de Física Teórica/Unesp