Uma das principais utilidades da teoria da termodinâmica é permitir aos físicos descreverem um sistema com um número imenso de graus de liberdade – caso de um mol de gás ideal em um recipiente, com suas 6 x 1023 de moléculas, cada uma com velocidade e posição diferentes – utilizando apenas alguns poucos parâmetros, como a temperatura. A teoria clássica da termodinâmica, porém, só funciona bem em situações próximas do equilíbrio térmico. Motivados pelos avanços da nanotecnologia e da computação quântica, pesquisadores trabalham atualmente para estender a termodinâmica para sistemas fora do equilíbrio térmico na escala microscópica, em que as leis da física clássica dão lugar as da mecânica quântica.
Um estudo publicado em outubro na Physical Review Letters mostra que, assim como a temperatura de uma máquina térmica clássica determina sua produção de trabalho, a chamada coerência quântica pode determinar o trabalho realizado por uma máquina térmica quântica.
“Nosso principal resultado foi generalizar a primeira e a segunda lei da termodinâmica para reservatórios térmicos que, além de terem uma temperatura bem definida, também possuem um pouco de coerência quântica, isto é, seu estado quântico é composto em parte por estados de energia bem definida em sobreposição”, explica Franklin Rodrigues, primeiro autor do estudo. Rodrigues, que atualmente faz doutorado na Universidade de Stuttgart, na Alemanha, colaborou com seu orientador de mestrado, Gabriel Landi, da Universidade de São Paulo, e com Mauro Paternostro e Gabriele De Chiara, da Queen’s University Belfast, na Irlanda.
A equipe construíu um modelo simples do tipo colisional, em que os reservatórios térmicos de uma máquina são descritos como uma fila de pequenos reservatórios que interagem um a um, sucessivamente, com o sistema. Cada pequeno reservatório é descrito por um estado quântico com alguma coerência. Os físicos descobriram que esse sistema produz trabalho mesmo quando interage com um apenas um único dos pequenos reservatórios térmicos. O resultado contradiz, portanto, a formulação clássica de Kelvin para a segunda lei da termodinâmica, segundo a qual uma máquina térmica precisa interagir com pelo menos dois reservatórios de temperaturas distintas para funcionar. O resultado porém não viola a formulação moderna e mais completa da segunda lei da termodinâmica, em termos da produção de entropia.
Além disso, Rodrigues explica que o trabalho produzido pela máquina é limitado pela coerência quântica que cada pequeno reservatório perde ao interagir com o sistema. Assim a perda de coerência resulta em ganho de trabalho. “O estudo possibilitou ver a coerência quântica como um recurso para máquinas térmicas quânticas e portanto esperamos que possa ter alguma aplicação interessante no futuro.”
A pesquisa teve apoio financeiro da FAPESP e do CNPq.
Artigo científico
Thermodynamics of Weakly Coherent Collisional Models
Franklin L. S. Rodrigues, Gabriele De Chiara, Mauro Paternostro e Gabriel T. Landi
Phys. Rev. Lett. 123, 140601 – 3 de outubro de 2019
ArXiv:1906.08203
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