Após a descoberta do grafeno em 2004, cientistas conseguiram provar a estabilidade de um “primo“ do material que é chamado de Grafite ABC ou Grafite Romboédrico. A diferença entre eles é que o primeiro é um material bidimensional, tão fino quanto o tamanho de um átomo; enquanto o segundo é tridimensional, embora ambos sejam compostos por carbono. Um físico da Universidade de São Paulo (USP) em parceria com pesquisadores da Universidade de Uppsala, na Suécia, e BITS Pilani, na Índia, realizaram um estudo teórico que revelou dois tipos de magnetismo no Grafite ABC.

Os dados da descoberta estão no artigo Competing magnetic states on the surface of multilayer ABC-stacked graphene, publicado na Physical Review B, no dia 3 de dezembro de 2024. “O que esse trabalho faz de especial é estudar não o que acontece no sistema tridimensional, mas exatamente na superfície, chamada banda chata. Isso porque você tem um nível, um valor de energia que vários elétrons diferentes podem apresentar com momentum distinto, que são as velocidades”, explica Lauro Braz, doutorando da USP que assina o artigo junto aos cientistas Tanay Nag e Annica M. Black-Schaffer, do BITS Pilani e do Departamento de Física e Astronomia da Universidade de Uppsala, respectivamente.

Lauro Braz, doutorando em Física e um dos autores do artigo Competing magnetic states on the surface of multilayer ABC-stacked graphene, publicado na Physical Review B.

O estudo focou em entender como essas interações, representadas pela chamada repulsão de Hubbard, afetam o comportamento magnético do material. A repulsão de Hubbard descreve como os elétrons evitam se sobrepor no mesmo espaço. Para estudar o sistema, os cientistas usaram uma técnica chamada aproximação de fase aleatória (RPA, na sigla em inglês), que ajuda a prever os estados magnéticos possíveis.

Os resultados mostraram que, dependendo da força da interação entre os elétrons e da quantidade de elétrons adicionados ao material (dopagem), o grafite ABC pode exibir vários tipos de magnetismo. Em alguns casos, ele forma ordens ferromagnéticas, em que os spins dos elétrons apontam na mesma direção. Em outros, surgem ordens ferrimagnéticas, onde os spins se organizam em padrões alternados, mas que a média dos momentos magnéticos é diferente de zero.

“O que a gente mostrou é a interação entre elétrons durante um evento de espalhamento: é possível que dois elétrons entrem com momentos distintos, mas ao final, eles saem com o mesmo valor de momento, algo que a gente chama de interação com o espalhamento tipo intravale; mas existe também evento de espalhamento entre vales distintos. E aí, esse evento de espalhamento acontece com um valor de momento finito, tal que um elétron entra com um valor de momento e sai com um momento diferente”, explica o cientista.

Segundo Braz, o estudo aponta que os estados magnéticos são estáveis e revelam a força de espalhamento dos elétrons que vai influenciar o tipo de magnetismo que tem nesse sistema. “A princípio eles seriam ferromagnetos; Só que quando há interações mais fortes, eles se tornam ferrimagnetos”, explica o jovem cientista, que passou um ano de estudos na Universidade de Uppsala. “Uma das principais conclusões desse trabalho é que os estados magnéticos que vivem nessa banda chata são estáveis. Estáveis no sentido de que eles têm uma vida longa de duração, eles demoram para se decaírem em outros tipos de excitações.”

O estudo ajuda a entender como diferentes formas de magnetismo podem surgir em materiais como o grafite e abre caminho para explorar aplicações em dispositivos que utilizam propriedades magnéticas para processar ou armazenar informações. “Uma vez que esse magnetismo é estável, ele pode ser utilizado em aplicações, por exemplo, na área de spintrônica, no qual as pessoas estão justamente procurando magnetos que tenham padrões de spin estáveis e consigam levar informação através do sistema para que você tenha seu qubit de spins.”

(Colaborou Roger Marzochi)