A Secretaria de Políticas e Programas Estratégicos (SEPPE) criou um Grupo de Trabalho (GT) para planejar o papel do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) para fortalecer o papel da ciência durante a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), que será realizada em novembro de 2025, em Belém (PA). E a Sociedade Brasileira de Física (SBF) está convidada a fortalecer esse debate entre seus associados e abrir diálogo com as diversas esferas de governo.

“A ideia principal é a proposta de um espaço onde se discuta mais ciência na COP30 com os pesquisadores ligados às questões climáticas. Queremos integrar a comunidade científica na busca de alternativas para a redução das emissões de CO2 no Brasil e esperamos poder apresentar respostas efetivas e propostas na COP30 em Belém”, afirma Andrea Brito Latgé, Secretaria da SEPPE, que participou da COP 29, em Baku, no Azerbaijão.

“A Sociedade Brasileira de Física pode ajudar divulgando a temática entre seus sócios e organizando painéis e debates sobre o tema. Podemos ainda organizar uma chamada de seleção de propostas, visando modelos alternativos de redução das emissões”, diz Andrea, que integrou o Conselho da SBF. “Temos clareza que ainda há muito espaço para avançar, mas também temos a segurança em afirmar que estamos caminhando com passos seguros construindo capacidades para que o país atenda aos compromissos internacionais e às demandas internas baseado em evidências científicas.”

O fortalecimento da ciência nesses debates é extremamente importante tendo em vista ao resultado da COP 29, que terminou na semana passada em Baku. Os países desenvolvidos firmaram a promessa de investir anualmente US$ 300 bilhões em um fundo para financiar a transição energética e a adaptação dos países em desenvolvimento às mudanças climáticas. Houve também a regulamentação do mercado de crédito de carbono, que deve remunerar os países que conseguirem reduzir suas emissões de CO2. Por um lado, o valor a ser investido no fundo é bem maior que os US$ 100 bilhões antes debatido, mas ainda muito abaixo das verdadeiras necessidades dos países em desenvolvimento. “O que vemos de fato é que a lacuna de implementação das ações climáticas é cada vez maior e temos que trabalhar para que não se torne irreversível. O acordo que foi alcançado em Baku foi o possível, mas diante de vários estudos indicativos de que o valor precisa ser bem mais consistente”, afirma a física.

De acordo com a cientista, uma das mensagens-chave do Emissions Gap Report de 2024, produzido pela Unep, programa ambiental da ONU, aponta que a concretização do potencial de mitigação para atingir as metas de conter o aquecimento global exigiria um investimento incremental estimado entre U$$ 0,9-2,1 trilhões dólares por ano de 2021 a 2050. O Grupo Independente de Peritos de Alto Nível sobre Financiamento Climático (IHLEG) apontou que o investimento, considerando transição energética, adaptação e resiliência às mudanças climáticas, perdas e danos e proteção da natureza e da biodiversidade para todo o planeta fica entre US$ 6,3 e 6,7 trilhões anuais até 2030.

Segundo o Comitê Permanente de Finanças da UNFCCC, os países em desenvolvimento necessitarão entre US$ 5,036 e US$ 6,876 trilhões até 2030 para cobrir os custos de alcançar suas metas climáticas. “Vemos que os números são bem expressivos, mas não podemos esquecer que o custo de não investir pode ser muito superior. Além disso, os países em desenvolvimento são os que mais precisam de apoio em termos de transferência de tecnologia, investimento e desenvolvimento de capacidades nacionais para construir resiliência, reduzir as emissões, transformar os sistemas de produção. Os benefícios desse investimento serão para todo o planeta”, explica Andrea, membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC).

Para ela, a regulamentação do mercado de crédito de carbono foi um avanço importante, mas não é panaceia. “Contudo, compreendemos que o mercado de carbono é um dos instrumentos relevantes para a transição e que deve ser utilizado para acelerar a redução de emissões de gases de efeito estufa. Faz parte de um conjunto de ações que precisam ser implementadas em escala. É muito relevante, mas não deve ser visto como a solução para todos os problemas. Devemos brigar por uma redução altamente otimizada como meta”, afirma.

A cientista avalia que, apesar da eleição de Donald Trump à Presidência dos Estados Unidos, um reconhecido negacionista climático, a maior potência econômica e militar do planeta deverá manter seus projetos verdes. “Precisamos aguardar para verificar quais serão as medidas concretas que ele vai adotar. Contudo, é importante observar que investimentos públicos (dos governos subnacionais) e privados dos Estados Unidos estão fortemente direcionados para a área verde. Acho pouco provável e quero crer que essa rota seja alterada ou revertida no curto prazo”, analisa a cientista, professora e pesquisadora de física da Universidade Federal Fluminense (UFF) e que já integrou o Conselho da Sociedade Brasileira de Física (SBF).

Mudanças Climáticas e a Física – Sobre como a ciência e tecnologia pode colaborar para a redução das emissões de CO2 no Brasil e qual é o papel da Física nesse processo, Andrea explica que o MCTI tem grande importância nessa questão da “agenda climática, em especial para a parte de transparência”.

“O nosso trabalho remonta ao surgimento das três Convenções criadas na Rio 92, quando foi instituída uma coordenação dedicada à área de clima. As contribuições mais recentes demonstram que estamos envolvidos em todas as iniciativas relevantes como: o Plano Nacional de Mudança Climática (Plano Clima) tanto na área de adaptação quanto na área de mitigação; na construção da nova Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC); e na proposta do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (mercado regulado de carbono)”, explica a cientista.

Segundo ela, com o Acordo de Paris, em particular com a Estrutura de Transparência Aprimorada, “temos a compreensão de que os dados são ainda mais relevantes”. “Desenvolvemos a Plataforma SIRENE Organizacionais para engajar as empresas na agenda de mitigação e que pode ser adaptado para atender aos critérios do sistema de Mensuração/Monitoramento, Relato e Verificação, do mercado de carbono – que acabou de ser aprovado pelo Congresso. Disponibilizamos outra plataforma, a Adapta Brasil, para ter informações que subsidiem a formulação de planos de adaptação. Há anos temos a plataforma SIRENE dando transparência para os dados de emissões do país.”

Expectativas para a COP30 – Para Andrea, o primeiro desafio da chamada COPS das COPS, em Belém, no próximo ano, é conseguir uma infraestrutura capaz de receber um público amplo, “satisfazendo as necessidades dos staffs das autoridades internacionais”.

“Olhando a infraestrutura de Baku, uma cidade com uma rede hoteleira e de restaurantes muito superior à de Belém, e que mesmo assim teve que montar vários esquemas alternativos, já nos deixa bastante preocupados. A COP29 em Baku teve como lema o financiamento e acabou deixando muitas frustações. A COP30 está sendo desenhada para ser a COP de realizações. O Brasil já colocou sua NDC de forma célebre e com limites não conservadores de redução de emissão. Vamos precisar agir neste período agora de menos de um ano, para podermos mostrar resultados significativos de redução de desmatamento e de redução de emissão de gases de efeito estufa. Para cobrarmos externamente precisamos agir eficazmente internamente.”

Mesmo com esse desafio, sua visão é positiva. “Na minha avaliação, realizar uma COP no Brasil é uma oportunidade única para o país de consolidar o trabalho que já tem sido feito. Também o simbolismo de realizar uma COP em uma localidade tropical, especialmente da Floresta Amazônica, deve ser considerado. Nossa expectativa é de que a ciência seja mais ouvida e considerada para que possamos acelerar nossa caminhada para enfrentar a mudança do clima.”

(Colaborou Roger Marzochi)