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Google Doodle em homenagem ao centenário do físico César Lattes.

Ícone chamado de “Doodle” foi estampado no início da ferramenta de pesquisa no Brasil, Reino Unido, México e Irlanda.

O site da ferramenta de pesquisa online Google, da empresa Alphabet, celebra nesta quinta-feira, dia 11 de julho de 2024, os cem anos de nascimento do físico brasileiro César Lattes com um “Doodle”, uma imagem animada no topo do site, por meio da qual é possível conhecer a vida do cientista e pesquisar reportagens a ele relacionadas. A imagem está visível aos usuários do Google no Brasil, Reino Unido, México e Irlanda.

No Trend Topics do Google na data do dia 10 de julho, as pesquisas sobre o nome do físico ocupavam o 5º lugar no Brasil, com mais de 500 mil pesquisas. Às 10h desta quinta-feira, os nomes César Lattes, Física e Píon lideravam as pesquisas em tempo real nas últimas 24 horas da ferramenta de pesquisa no País.

E, apesar de o Doodle estar visível em quatro países, esse tipo de promoção do Google estimula matérias em veículos de outros países, como é o caso do Times of India, que publicou na versão online um texto citando a importância de Lattes para o desenvolvimento da Física de Partículas e a sua inspiração como professor de universidades.

Nascido em Curitiba, Lattes desejava desde pequeno ser professor e teve um impulso da família para seguir o caminho de cientista, conta ao Boletim SBF Antonio Videira, professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e pesquisador-colaborador do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), criado graças a Lattes.

César Lattes e Eugene Garner, 1948. (Credito: CBPF)
César Lattes e Eugene Garner, 1948. (Credito: CBPF)

O pai de Lattes era italiano, responsável por uma casa bancária da família em Turin, que inclusive pagava o salário do físico ucraniano Gleb Wataghin que, após a Revolução Russa, imigrou para a Itália e chegou ao Brasil em 1934. O velho Lattes, percebendo que seu filho tinha aptidão para as ciências, incentivou o contato dele com Wataghin.

“O Wataghin era uma pessoa muito entusiasmada, muito apaixonada pelo que fazia, pela física em particular. E ele procurava seduzir as pessoas para irem para a carreira de físico. Ele gostava tanto de física que os seus dois filhos acabaram também abraçando a carreira”, lembra Videira, em reportagem publicada no site da SBF em maio. Com o incentivo de Wataghin, Lattes entrou na Universidade de São Paulo (USP), trilhando uma carreira brilhante.

Giuseppe Occhialini, físico italiano que estava no País desde o início da década de 1930, levou Lattes, aos 22 anos, para trabalhar Laboratório H. H. Wills, em Bristol, na Inglaterra, que desenvolvia uma pesquisa de física nuclear que usava filmes fotográficos especiais para os seus estudos, que foram aprimorados por Lattes. Foi por meio desses filmes que, em 1947, Lattes confirmou a existência do méson pi, hoje chamado de píon, no Monte Chacaltaya, no Bolívia, dando importante contribuição para o desenvolvimento da física de partículas.

Após a Segunda Guerra Mundial, com a busca pelo uso da energia atômica para defesa e produção de energia, a ideia de um brasileiro revelando os segredos dos átomos fez de Lattes uma celebridade, que ajudou a impulsionar a criação do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), o CNPq e a inspirar milhares de estudantes. “Ele tinha uma inteligência brilhante, era de fato fora de série. A sua cultura geral, não só em Física, mas também sobre outros assuntos, como em literatura e história geral, era espetacular”, lembra a física Carola Dobrigkeit Chinellato, professora da Unicamp, que teve o primeiro contato com Lattes em 1972 na instituição de ensino, em reportagem do Boletim SBF publicada em junho.

O físico Ildeu Castro Moreira, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), fez uma pesquisa sobre as notícias de jornal publicadas na década de 1940 sobre César Lattes. E, em palestra no simpósio “Dos Raios Cósmicos aos Aceleradores de Partículas”, realizado entre 1 a 3 de julho, no Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IFUSP), mostrou slides que revelam muito bem o papel de Lattes no imaginário da época, na mesa redonda Lattes e a Institucionalização da Ciência no Brasil.

Recorte de Jornal noticiando a descoberta do físico César Lattes.
Slide apresentado por Ildeu no Simpósio Dos Raios Cósmicos aos Aceleradores de Partículas no IFUSP no início de julho.

“Sensacional descoberta de um cientista brasileiro”, era a manchete do jornal A Noite, em fevereiro de 1948. Já o jornal Correio Paulistano, de 10 de março de 1948, chegou até a dizer que Lattes era paulista. A descoberta do píon ocorreu no ano anterior, mas os jornais só repercutiram no ano seguinte, após Lattes detectar píons gerados artificialmente nos Estados Unidos. “Quase todos os jornais traziam esse tipo de manchete. E, na foto, havia um jovem de 23 anos. Eu acho isso uma coisa marcante”, diz Ildeu. “Um moleque brasileiro se destacar no exterior, fazendo pesquisa de altíssimo nível, é um momento de fortalecimento do nacionalismo brasileiro depois da Segunda Guerra.”

O vol. 22 da revista A Física na Escola (FnE) também celebrou o centenário de Lattes e da professora Beatriz Alvarenga (1923-2023), com um editorial que ressaltou que eles não eram gênios isolados, pois na ciência é importante o amparo de uma rede de contatos e pesquisa, que propiciam a criatividade na ciência por meio da qual os avanços podem ser constituídos e compartilhados em sua materialidade.

“Isso não tira o mérito de Lattes e Beatriz enquanto pessoas revolucionárias, mas queremos pontuar que havia uma rede de apoio e um ambiente de estímulo à criatividade para que isso acontecesse. Muitas dessas pessoas permanecem anônimas, mas a ciência não é resultado da ação de um gênio isolado”, reafirma o editor da FnE Marlon Cesar de Alcantara, professor do Laboratório Interdisciplinar de Ensino de Ciências do Instituto Federal do Sudeste de Minas Gerais (IF Sudeste MG), Campus Juiz de Fora, em matéria do Boletim SBF de junho.

(Colaborou Roger Marzochi)