Pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) geraram em laboratório uma fonte de luz laser que combina dois fenômenos nunca antes observados no mesmo sistema fotônico: as chamadas fases de turbulência e de vidro de spin. “Essas duas fases persistem ainda não completamente entendidas nos sistemas físicos”, diz Ernesto Raposo, físico da UFPE e coautor do artigo publicado essa semana na Scientific Reports.
Todo o trabalho foi realizado na UFPE por Raposo e seus colegas na instituição, Iván González, Antônio Macêdo, Leonardo de Menezes e Anderson Gomes. Os experimentos utilizaram um laser aleatório, uma classe especial de laser em que a retroalimentação vem do espalhamento múltiplo dos fótons em um meio material desordenado, no caso, um fio de fibra óptica dopado com átomos de érbio.
Observável nos padrões caóticos de redemoinhos em uma correnteza de água, a turbulência é um fenômeno comum na natureza, ocorrendo em muitos sistemas físicos além dos fluidos complexos. Raposo e seus colegas já haviam identificado a turbulência na emissão de intensidade de uma fibra tipo laser aleatório, resultado publicado ano passado, na Nature Comunications.
Já os chamados vidros de spins foram originalmente descobertos na década de 1970, quando pesquisadores observaram materiais magnéticos resfriados a temperaturas próximas do zero absoluto com os spins de seus átomos fixos em direções aleatórias, em um tipo de desordem que lembra a estrutura microscópica de materiais como o vidro. Na década passada, foi demonstrada uma versão fotônica dos vidros de spins, em que as amplitudes dos modos das ondas eletromagnéticas de um laser é que congelam em valores aleatórios. A equipe da UFPE e seus colaboradores também investigaram esse fenômeno em artigo publicado em 2016, na Scientific Reports.
O problema é que as medidas normalmente utilizadas para identificar a turbulência não servem para identificar a presença simultânea de um comportamento do tipo vidro de spin, e vice-versa. Os pesquisadores da UFPE precisaram então desenvolver uma nova quantidade que realizasse esse papel. “Definimos um coeficiente de correlação de Pearson fotônico que identifica a presença de ambos os comportamentos nos dados da intensidade da luz emitida pelo laser aleatório”, explica Raposo. “O cálculo teórico concordou bastante bem com os dados experimentais”.
O trabalho pode ajudar a avançar na compreensão de cada fenômeno separadamente e também nas relações intrínsecas que existem entre eles. Raposo destaca ainda que o estudo poderá ser importante também para desvendar conexões sutis que existem com outros fenômenos complexos, particularmente em fotônica, como a propagação de ondas em meios não-lineares desordenados, as estatísticas de Lévy de flutuações de intensidades e as rogue waves.
Artigo científico
Coexistence of turbulence-like and glassy behaviours in a photonic system
Iván R. R. González, Ernesto P. Raposo, Antônio M. S. Macêdo, Leonardo de S. Menezes & Anderson S. L. Gomes
Scientific Reports, v, 8, 17046 (2018)
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Igor Zolnerkevic
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