Pedro Rosario nasceu em Montería, na Colômbia, e se apaixonou por Física quando descobriu seu talento pela matemática durante o que corresponde ao Ensino Médio daquele país. Formou-se em Física ao final de 2021 e, em 2022, iniciou seu doutorado na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) com uma bolsa financiada pela Fundação Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Após passar dois anos no interior de São Paulo, Rosario obteve, em 2024, uma bolsa de estágio de pesquisa no exterior (BEPE) para realizar parte do doutorado na Universidade de Estrasburgo, na França. Ele é o principal autor de uma pesquisa que poderá alavancar a utilização da computação quântica, criando um método eficaz para detectar o emaranhamento em sistemas quânticos de grandes proporções.
O resultado da pesquisa está no artigo “Detecting Entanglement from Macroscopic Measurements of the Electric Field and Its Fluctuations”, publicado no periódico científico Physical Review Letters (PRL), no dia 31 de julho. Entre os autores da UFSCar, encontram-se Alan C. Santos, André Cidrim e Romain Bachelard. “São Paulo, em particular, é um dos melhores lugares para estudar informação quântica e tecnologias quânticas atualmente no Brasil e, também, na América Latina e no mundo. Há pesquisadores muito bons em São Carlos, Campinas e São Paulo. Em particular, na UFSCar tem grupos muito bons na área, como os liderados pelos professores Celso Villas-Bôas e Romain Bachelard”, diz P. Rosario sobre sua decisão de estudar no País, em entrevista ao Boletim SBF.
Mas por que é tão importante essa pesquisa? Segundo Rosario, o emaranhamento quântico, um fenômeno em que partículas ficam interligadas de tal forma que o estado de uma afeta diretamente o estado da outra, mesmo que estejam separadas por grandes distâncias, é uma peça central nas tecnologias quânticas. Identificar e medir esse emaranhamento, no entanto, é um grande desafio, especialmente em sistemas grandes, como os usados em computação quântica. “Quando você tem três, quatro, cinco partículas ou mais, quantificar/detectar o emaranhamento é muito complicado”, explica. Isso porque, normalmente, métodos tradicionais como a tomografia quântica da matriz densidade exigem medições complexas, que se tornam inviáveis em grandes escalas.
A pesquisa, liderada pelo professor Romain Bachelard, propõe uma abordagem inovadora para superar essas dificuldades. “Nós estamos pegando o campo elétrico, que é uma quantidade macroscópica que você pode medir no laboratório, e o estamos medindo para determinar se o estado quântico das partículas está emaranhado ou não”, explica. Isso significa que, em vez de medições individuais de cada partícula, algo difícil de ser feito em sistemas grandes, o método se baseia em medições macroscópicas do campo elétrico espalhado por uma nuvem de átomos.
O uso de testemunhas de emaranhamento — desigualdades matemáticas que indicam a presença de emaranhamento — continua sendo parte essencial da detecção. No entanto, o que diferencia o trabalho de Rosario é que eles desenvolveram um conjunto de oito novas desigualdades: se uma dessas desigualdades é violada, o sistema está emaranhado. “Se apenas uma dessas desigualdades é violada, podemos afirmar que o sistema está emaranhado”, diz ele. E a grande inovação do método é que ele funciona independentemente do tamanho do sistema. “O número de partículas não é mais uma limitação. Nós podemos detectar o emaranhamento em sistemas com cem, mil, um milhão de partículas.”
Essas descobertas podem ter um impacto significativo em uma ampla gama de sistemas quânticos, como átomos aprisionados, circuitos supercondutores, átomos em espaço livre e até mesmo átomos gigantes de Rydberg. “Esse método pode ser aplicado em qualquer sistema atômico onde o espalhamento do campo elétrico é possível”, afirma Vargas.
Outro ponto importante destacado na entrevista é a simplicidade das medições. “Nós estamos medindo o campo elétrico espalhado pela nuvem de átomos. Você tem uma nuvem de átomos e eles espalham uma luz. Essa luz espalhada, nós a medimos, e simplesmente medindo-a, podemos dizer se o sistema é emaranhado ou não”, explica Rosario. Essa simplicidade é uma das razões pelas quais o artigo foi aceito pela PRL, um dos periódicos mais prestigiados do mundo científico, lembra o cientista.
Embora seja uma pesquisa teórica, o foco do trabalho está na aplicabilidade experimental. Como o próprio Rosario explica, “hoje em dia, empresas como IBM, Google, Amazon e outras grandes companhias estão investindo muito em tecnologias quânticas. Elas estão procurando ferramentas para medir o emaranhamento em sistemas de muitas partículas”. O método desenvolvido na UFSCar, com colaboração de cientistas da Itália e da França, visa preencher essa lacuna, oferecendo uma solução prática para esses desafios. “Nossas ferramentas foram pensadas para aplicações experimentais em sistemas muito grandes, como os que essas empresas estão desenvolvendo.”
O estudo de P. Rosario, apesar de inovador, não surgiu em um vácuo. Há propostas similares, mas que, segundo ele, utilizam quantidades diferentes para detectar o emaranhamento. “Nós propomos como figura do mérito o campo elétrico espalhado por uma nuvem de átomos. O campo elétrico é uma quantidade muito conhecida, e intuitiva de estudar”, diz. No contexto da computação quântica, o emaranhamento é uma peça fundamental, pois é ele uma das ferramentas que permite um aumento significativo na velocidade das operações computacionais, em comparação com os computadores clássicos.”
Com essas contribuições, a pesquisa desenvolvida pela equipe da UFSCar, não só simplifica a detecção de emaranhamento em grandes sistemas quânticos, como também abre novas portas para o avanço das tecnologias quânticas. Em uma área em rápida expansão, onde grandes empresas estão investindo bilhões para desenvolver computadores quânticos mais eficientes, ferramentas como essas são essenciais para impulsionar a próxima geração de inovação tecnológica.
(Colaborou Roger Marzochi)