Victor Buratto

Victor Buratto Tinti está na vanguarda das pesquisas sobre a aplicação do óxido de cério, um material que se deforma quando submetido a r uma tensão elétrica e que pode ser usado em materiais leves, como poliamida e PET.

Imagine um material extremamente fino, flexível e transparente que pode ser moldado de acordo com a tensão elétrica nele aplicada.. A céria, um óxido metálico, apresenta propriedades de deformação eletromecânica significativamente ampliadas quando dopada, tornando-se capaz de sofrer grandes mudanças de forma em resposta à aplicação de um campo elétrico. “Pode-se comparar o óxido de cério aos músculos do nosso corpo, com a diferença que ele não transporta corrente elétrica”, explica Victor Buratto Tinti, engenheiro de materiais da Universidade Federal do ABC (UFABC) e estudante de pós-doutorado na Universidade Técnica da Dinamarca (DTU), no Departamento de Conversão e Armazenamento de Energia (DTU Energy).

Utilizado comumente como um dos componentes de células a combustível, esse material inspirou novos estudos a partir de 2012, quando o cientista Igor Lubomirski, nascido na União Soviética na região onde fica a Ucrânia, descobriu as propriedades eletromecânicas do material. E foi na área de células a combustível que Tinti conheceu o material, quando no início de sua graduação em Engenharia de Materiais na UFABC, começou um projeto de iniciação científica no laboratório de células a combustível do físico Daniel Zanetti de Florio, professor da mesma instituição de ensino.

“Eu fui muito tempo aprendendo, mas eu sempre fui meio a ovelha negra do laboratório. Não no sentido que eu estava fazendo coisas erradas, mas no sentido que o laboratório era de célula a combustível e eu sempre pegava materiais de célula a combustível e trabalhava com aplicações diferentes”, diz Tinti, que manteve uma parceria de 10 anos com Florio nesse laboratório. Com o destaque criado pela descoberta de Lubomirski e o interesse de Tinti por novas aplicações com a céria, Florio incentivou o aluno a fazer doutorado sobre o tema, incluindo um doutorado sanduíche na Dinamarca sob a supervisão do professor Vincenzo Esposito.

Victor Buratto em experimiento na linha NanoMax do Laboratório de Luz Sincrontron MAX IV, Suécia.
Victor Buratto em experimiento na linha NanoMax do Laboratório de Luz Sincrontron MAX IV, Suécia.

A parceria levou a grandes resultados. Em primeiro lugar, Tinti, que está há mais de dois anos em seu pós-doutorado na Dinamarca, assina com Florio, Esposito e outros cientistas o artigo “Oxygen-defective electrostrictors for soft electromechanics”, publicado em 30 de agosto no periódico científico Science Advances. O estudo científico comprova a eficiência da céria em criar dispositivos eletromecânicos utilizando poliamida ou PET, que são flexíveis, para aplicações médicas e controle focal de lentes que podem ser usadas em telecomunicações e observação espacial. “Nós mostramos nesse artigo que é possível mudar a curvatura de uma lente, alterando, então, a distância focal desse dispositivo ótico”, afirma Florio. Esse trabalho teve o apoio FAPESP por meio da chamada M.ERA-NET (2022/09589-6).

O resultado foi tão positivo que Tinti iniciou com Esposito um projeto batizado de PRISMA, financiado pela União Europeia, que consiste na produção de um tubo no qual o material gera ondas capazes de bombear insulina para o corpo humano de uma maneira extremamente refinada. Em outro projeto, nesse mesmo escopo, os cientistas recebem financiamento do Fundo da gigante farmacêutica Novo Nordisk, uma companhia com capital de US$ 570 bilhões e que ficou mundialmente conhecida pelo Ozempic.

“A ideia do projeto PRISMA é fazer uma bomba para conseguir dosar insulina. Para aplicar insulina hoje é usado uma seringa: você empurra a seringa, empurra o fluido para dentro de uma pessoa. Só que o problema disso é que você tem transientes, é muito difícil você dosar quantidades exatas e, principalmente quantidades, muito baixas. Por exemplo, às vezes você precisa dosar insulina em questão de microlitros por minuto. Em adultos, não é tanto problema porque a gente tem muita massa corporal. Mas no caso de criança é muito complicado. Se você ao invés de dosar um microlitro, você dosa dois microlitros, por exemplo. Como a gente consegue controlar bem finamente o quanto que a gente muda esse formato do tubo, conseguimos controlar muito finamente o fluxo”, explica Tinti. Que novos estudos possam colaborar no avanço da saúde e das telecomunicações, sempre com importante participação de cientistas brasileiros.

(Colaborou Roger Marzochi)