A Comissão de Área de Física na Empresa (FEM) da Sociedade Brasileira de Física (SBF) externa, por meio desta, sua extrema preocupação e posiciona-se contrária ao processo de liquidação da empresa pública federal Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada S.A. (CEITEC), vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), por meio do Programa de Parcerias de Investimento da Presidência da República (PPI).
A CEITEC é um patrimônio nacional estratégico e um empreendimento em infraestrutura tecnológica imprescindível para permitir uma alavancagem além da já tradicional Hélice Tripla, composta por Universidade-Indústria-Governo. As muitas e recentes mudanças a nível mundial expandiram a forma de relacionamento entre estes atores da chamada Hélice Tripla para novos modelos de geração do conhecimento, incluindo agora a sociedade (Hélice Quádrupla) e o meio ambiente (Hélice Quíntupla) que passaram a ser atores fundamentais na moderna dinâmica da inovação.
A Comissão SBF-FEM, no contexto de seus objetivos de promover o desenvolvimento da integração da comunidade científica em Física com o setor produtivo no Brasil, bem como de divulgar oportunidades de atuação profissional técnico-cientificas para Físicos em empresas brasileiras, entende que a liquidação da CEITEC representará uma grande perda de oportunidades para a atuação dos profissionais formados em Física em geral. A liquidação ocasionará uma lacuna de infraestrutura tecnológica indispensável para a aproximação e transferência tecnológica da academia com o setor produtivo. Seu impacto se estende além das diversas áreas específicas de formação dos Físicos, mas atinge uma vasta gama de profissionais das áreas científica e tecnológica. Ademais, a infraestrutura disponibilizada pela CEITEC permite a demonstração e materialização de muitos dos resultados de pesquisas de nossos cientistas em um ambiente tecnológico compatível com a produção em escala industrial.
Em um contexto mais amplo, a liquidação da CEITEC afeta o desempenho do próprio Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI), representando, no curto e médio prazos, uma perda irremediável de um componente único, em virtude das especificidades dessa empresa pública no cenário nacional. Considerando-se a atual escassez de infraestrutura de pesquisa tecnológica, bem como de suporte à inovação, do porte e características da CEITEC, o Brasil estará desprovido de um elemento essencial do SNCTI, justamente em um setor no qual o Brasil é notoriamente deficiente, qual seja o de elos de conexão entre a geração do conhecimento (majoritariamente oriundo de instituições de ciência e tecnologia, incluindo universidades e institutos de pesquisa), o desenvolvimento tecnológico e a inovação (empresas e indústrias).
A CEITEC, no cenário nacional, representa uma importante, relevante e insubstituível ponte para a conexão entre ciência, tecnologia, sociedade, governo, meio ambiente e inovação, uma vez que oferece ampla gama de serviços especializados de tecnologias de microeletrônica e de áreas correlatas em microfabricação, processamento e testes de dispositivos em pastilhas de silício, quartzo, carbeto de silício e nitreto de gálio, dentre outros serviços, estratégicos para o desenvolvimento nacional. Tais serviços da CEITEC podem ser acessados tanto pelos núcleos de pesquisa científica e tecnológica, como pela indústria de base tecnológica como, por exemplo, a de Semicondutores, Fotônica e as Tecnologias de Informação e Comunicação, que incluem a Internet das Coisas, dentre muitas outras; essas classes de indústrias ainda é escassa no Brasil, em boa parte pela falta de uma infraestrutura tecnológica minimamente estruturada para permitir seu suporte e alavancagem. E, por extensão, nada nos leva a crer que esta lacuna deixada pela CEITEC será ocupada pela iniciativa privada (IP), dada a ausência desta mesma IP, desde sempre, neste campo de atuação, que não é exclusivo do poder público, e dado ao enorme fluxo migratório de multinacionais privadas deixando de atuar na economia nacional brasileira.
A atual pandemia do COVID-19 tem demonstrado o poder estratégico de uma infraestrutura técnico-científica nacional adequada e plenamente disponível, não apenas para reduzir a dependência local com a pesquisa e a produção realizada em âmbito internacional, bem como para aumentar a capacidade nacional de contribuir para com as demandas específicas internas, seja de caráter comercial ou estratégico. Nesse contexto, cabe ressaltar que a CEITEC desenvolve ou contribui em parceria para pesquisas e tecnologias de aplicação na área de saúde como, por exemplo: no desenvolvimento de dispositivos da classe Lab-on-a-Chip, com aplicação em microfluídica, eletroquímica ou análise PCR, estas duas últimas apresentam potencial uso para detecção de vírus; e na manufatura de sondas neurais, dentre outras atividades.
A Comissão de Área SBF-FEM, portanto, posiciona-se pela interrupção do processo de liquidação da CEITEC, e pelo contínuo fortalecimento de sua atuação, de modo que o Brasil não venha a prescindir dessa infraestrutura tecnológica essencial e estratégica para a soberania do Brasil, em diversas áreas, e para a promoção de sua ciência, tecnologia e inovação. A Comissão de Área SBF-FEM coloca-se à disposição para contribuir, em todos os níveis, para com as autoridades comprometidas em preservar esse valioso empreendimento estratégico nacional.