Por Nathan Berkovits
Primeiramente, gostaria de agradecer a SBF e a carta Opinião de 6 de novembro por levantar o assunto importantíssimo da proposta recente de criar um mecanismo alternativo para contratar docentes nas universidades federais no Brasil via uma Organização Social. A proposta foi apresentada num simpósio no dia 22/9 pelo presidente da CAPES, Jorge Guimarães, e foi criticada logo depois como “desnecessária” pelo presidente do sindicato nacional de docentes (ANDES), Paulo Rizzo. Na carta Opinião de 6 de novembro escrita pela Profa. Barbosa no nome do conselho do IF-UFRGS, alguns problemas com o mecanismo atual para contratar docentes estrangeiros foram mencionados, como a exigência da língua portuguesa. Mas na minha opinião, a carta falhou em não mencionar o problema mais grave que levou o presidente da CAPES a declarar, “Tem muito corporativismo, muita carta marcada nas universidades públicas. Se concurso resolvesse, a universidade brasileira era a melhor do mundo. É democrático, mas erra-se muito.”
O problema mais grave com o mecanismo atual é a suposição que pesquisa pode ser julgada sem o aval de especialistas. No exterior, avaliações de especialistas via cartas de recomendação são crucias para qualquer decisão envolvendo contratações nos departamentos de física. Mas no Brasil, estas decisões de contratação são feitas por uma banca de físicos de subáreas diferentes sem a ajuda de qualquer informação além dos currículos dos candidatos. Com esta falta de informação, as decisões frequentemente são baseadas nas aulas didáticas e provas escritas sobre física básica, na contagem de publicações e outros números quantitativos, e nas conversas informais (e provavelmente ilegais) com colegas e outros membros da banca. Além disso, preocupação com a anulação do concurso por causa da violação das regras burocráticas proíbe qualquer tentativa de obter mais informação sobre os candidatos. Para dar um exemplo, participei recentemente na banca de um concurso na USP onde foi proibido qualquer tipo de pergunta ao candidato sobre sua aula didática ou sua prova escrita.
Este problema é especialmente grave para estrangeiros que querem emprego acadêmico no Brasil. No caso que um estrangeiro consegue juntar todos os documentos necessários para se inscrever no concurso, ele ainda vai ter que pagar sua passagem aérea e estadia para participar num concurso onde não são permitidas nem cartas de recomendação das pessoas que conhecem seu trabalho. Embora o Brasil seja um pais maravilhoso para estrangeiros (como eu) e o financiamento atual para pesquisa seja melhor aqui do que em muitos outros países, não deve ser surpresa que concursos brasileiros atraem poucos estrangeiros qualificados.
Para corrigir este problema grave, não vai ser suficiente somente “aperfeiçoar” as regras dos nossos concursos como sugerido na carta Opinião anterior. A proposta apresentada pelo presidente da CAPES de criar uma Organização Social para contratar docentes me parece uma solução que pode dar certo, supondo que o mecanismo vai ser o mesmo como utilizado pelo Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (IMPA). Ao contrário dos concursos federais no Brasil cujos editais exigem copias múltiplas de memoriais com taxas de inscrição e atividades devidamente comprovadas, um concurso para Pesquisador da Organização Social do IMPA tem o seguinte anúncio típico:
O Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) anuncia a abertura de duas posições de Pesquisador, inicialmente em caráter probatório (“tenure track”), em qualquer área da Matemática. O salário mensal será entre R$ 11.300,00 a R$ 15.000,00. Os interessados em candidatar-se a estes cargos deverão se inscrever até o dia 31 de dezembro de 2010, a documentação deverá ser requerida por meio do correio eletrônico ao endereço opening@impa.br. As decisões serão anunciadas em meados de março de 2011.
A documentação requerida deverá ter: plano de trabalho e curriculum vitae incluindo pelo menos:
1) lista de publicações atualizada;
2) data de nascimento;
3) instituição e ano em que completou o doutorado;
4) título da tese e nome do orientador;
Os candidatos deverão solicitar a pelo menos 3 matemáticos de renome que enviem cartas de recomendação (formato livre) para o mesmo endereço eletrônico.
Embora este tipo de anuncio possa parecer estranho para físicos brasileiros acostumados às paginas de regras nos editais dos nossos concursos, este anúncio do IMPA é semelhante aos anúncios para emprego acadêmico nos EUA ou na Europa. Estrangeiros de todas as partes do mundo aplicam para concursos do IMPA, e a participação destes estrangeiros no seu corpo docente ajudou a levar o IMPA a ser um dos mais prestigiados institutos de matemática no mundo inteiro. Embora institutos de física como o IF-UFRGS já tem pesquisa do nível internacional, não tenho duvida que estes institutos vão conseguir outro patamar de excelência se a contratação dos seus docentes fosse decidida da mesma maneira como a contratação de docentes nos EUA, na Europa e no IMPA.
Atenciosamente, Nathan Berkovits (professor titular do IFT-UNESP e diretor do ICTP-SAIFR)