Felix Hernandez, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo, descobre meio de manipular esse fenômeno de forma a permitir ampliar a sua aplicação na sociedade, principalmente no desenvolvimento de fontes de energia limpa
Quando vemos um cristal sólido sobre uma mesa, para nós parece que ele está parado, estático. Mas se fosse possível olhar para cada átomo que compõe o material, cada um deles está vibrando. E, juntos, unidos nesse material sólido, a vibração entre esses átomos gera uma frequência que quantifica esse movimento batizada de fônon. Por sua vez, os fônons possuem momentos magnéticos próprios e têm funções muito importantes nas propriedades elétricas, térmicas e ópticas dos materiais.
O cientista Felix Hernandez, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP), vem investigando esse tema. No ano passado, ele descobriu que a aplicação de um campo magnético externo ao material permite criar e controlar fônons quirais; agora, no fim de 2023, ele e sua equipe publicaram um artigo na revista Science Advances, no dia 15 de dezembro, que representa mais um passo importante para se estudar esse fenômeno.
O estudo “Observation of interplay between phonon chirality and electronic band topology” revela que, em um cristal com diferentes níveis de chumbo (Pb), estanho (Sn) e telúrio (Te), elétrons especiais das bandas topológicas do material são responsáveis pelo aumento do magnetismo do fônon. Segundo o cientista, ao adicionar estanho até 30% do material, a distância, o gap, entre as bandas de valência e condução são zeradas, abrindo no material uma fase topológica e criando condições para elétrons com propriedades peculiares. Por exemplo, esse tipo de cristal estudado apresenta condução de eletricidade na área externa, mas é um isolante internamente.
Mas por que é importante potencializar o magnetismo do fônon? Segundo Felix, sem a aplicação de um campo magnético externo, o movimento dos átomos no material se caracteriza por ações lineares. Porém, com um campo magnético forte, de mais de 25 teslas, que é muito superior ao campo magnético da Terra de 0,00005 tesla, os fônons realizam movimentos circulares ou quirais, como ele revelou em pesquisa publicada na Physical Review Letters (PRL) em fevereiro de 2022. Esses fônons quirais são fônons transversais ópticos na região espectral de 1 terahertz e, portanto, permitem seu estudo através da absorção de luz nessa frequência.
O problema é que essa interação com o campo magnético externo depende do nível de magnetismo dos fônons, baixo em materiais com topologia trivial, o que tornaria a aplicação tecnológica muito difícil devido à necessidade de usar fontes de campo externo gigantescas. Assim, o grupo de cientistas buscou misturar chumbo, estanho e telúrio de tal forma que se criou um isolante topológico cristalino com bandas de energia de valência e de condução especiais. E o experimento revelou que há uma grande interação entre fônons e elétrons do material, de tal forma que este último é o responsável pelo aumento no nível de magnetismo do fônon.
“Há muitas aplicações em sistemas termoelétricos que podem ser usados para a produção de energia limpa. O telureto de chumbo, um material muito usado atualmente, tem um momento magnético pequeno e precisaria de 30 teslas para controlar o fônon. Mas podemos aumentar o momento magnético dos fônons para serem controlados por um campo menor. Para fazer isso tem que adicionar estanho e levar o material na fase topológica na qual o magnetismo do fônon é aumentado por meio destes elétrons especiais”, diz o cientista sobre esse processo, que é chamado de dopagem do material.
Desde da teorização desse fenômeno, descrito em 1929 pelo físico teórico soviético Igor Tamm, o mesmo que venceu o Nobel de Física em 1958 junto com os colegas Pavel Cherenkov e Ilya Frank pela descoberta da “luz Cherenkov”, o estudo do fônon continua sendo muito importante para a ciência e trazendo à luz novas descobertas, que fascinam cientistas, estudantes e curiosos sobre o tema.
(Colaborou Roger Marzochi)