De forma inovadora, nanoequipamento desenvolvido em parceria com a Unicamp transforma ondas eletromagnéticas de sistemas quânticos em vibração mecânica que, por sua vez, dialoga com a luz infravermelha das fibras óticas que conectam o mundo e que poderão interligar computadores quânticos
Ao mesmo tempo em que gigantes da tecnologia como Google, IBM e Amazon estão na disputa pela criação de computadores quânticos confiáveis, pesquisadores de todo o mundo estudam formas para que essas máquinas possam estabelecer uma comunicação mesmo a grandes distâncias, o que proporcionaria a criação de uma internet dentro das mais velozes taxas de transmissão desse novo modelo de processamento de dados.
Um grande passo nesse sentido foi dado com a ajuda de pesquisadores brasileiros do Instituto de Física Gleb Wataghin, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Em pesquisa publicada em setembro na revista Nature Communications, os cientistas da Unicamp André Primo, Pedro Pinho, Thiago P. Mayer Alegre, Gustavo S. Wiederhecker e os pesquisadores Rodrigo Benevides (ETH Zürich, na Suíça) e Simon Gröblacher (Universidade Técnica de Delft, na Holanda) apresentaram um sistema inovador de optomecânica dissipativa.
Em entrevista ao Boletim da SBF, André Primo explica que os computadores quânticos são operados em verdadeiras geladeiras, com temperatura no nível de 10 milikelvin, bem abaixo da temperatura média no espaço sideral. Nessas máquinas a informação é armazenada em micro-ondas, campos eletromagnéticos que oscilam em frequências de Gigahertz, ou seja, um bilhão de vezes por segundo. Ao buscar interligar essa informação com outra máquina quântica por meio de um simples cabo, a temperatura ambiente destruiria a informação, impedindo a comunicação entre as máquinas.
A busca é fazer com que dois sistemas quânticos troquem informações por meio de fibras óticas já utilizadas amplamente, blindando tais informações do ruído introduzido pela temperatura ambiente. Há, no entanto, o desafio de fazer com que um sinal de luz na frequência de micro-ondas se transforme na luz infravermelha usada nas fibras ópticas de comunicação usual. Uma possível saída é realizar essa transformação mediada por um equipamento que gera vibrações mecânicas, atuando como ponte de via dupla nesse processo. “Parte importante do processo, seria então primeiro converter luz em vibrações mecânicas e vice-versa. É nesse processo que fizemos um avanço”, comenta André Primo.
Pedro Pinho completa que, nas últimas décadas, os estudos caminharam para sistemas que realizam a chamada transdução da frequência a partir da optomecânica dispersiva. Esse sistema é composto por um nanomaterial de silício que passa por uma litografia por feixe de elétrons, algo que gera um padrão no material e que “retém” a luz em uma faixa curta de frequências (ver ilustração que abre o post). Na optomecânica dispersiva, as vibrações mecânicas alteram a faixa de frequências na qual a luz fica confinada.
O que os pesquisadores propuseram neste novo estudo é utilizar a optomecânica dissipativa, efeito que modula a taxa de dissipação da onda eletromagnética para fora do nanodispositivo, como uma porta de interação entre luz e movimento mecânico. “A luz precisa entrar e sair do nosso dispositivo. O que chamamos de dissipação é essa troca de energia entre a cavidade e o meio externo. E a porta para isso é o guia de onda, pelo qual a luz entra em nosso dispositivo. Em nosso sistema, a taxa de troca de energia muda junto com o movimento. E então pode ocorrer as duas coisas juntas, dispersão e dissipação, é nessa situação que a brincadeira fica legal”, explica Pedro Pinho. “O dispositivo consegue controlar esse tipo de sobreposição dos efeitos dispersivos e dissipativos abrindo novas possibilidades.”
André Primo explica que futuras inovações podem melhorar a eficiência desse processo. E que a sua aplicação pode tanto colaborar com a criação de uma internet quântica quanto para atuar como sensores de massa para moléculas ou proteínas. Segundo ele, ao colocar esses elementos sobre o dispositivo a frequência de vibração do material se alteraria. “Esse seria o melhor sensor para coisas muito leves, o que potencialmente serviria para identificar rapidamente espécies químicas”
(Colaborou Roger Marzochi)